Há 3 anos, o Pacto desenvolve programas do eixo da prevenção social visando à mudança de comportamento de famílias, à preparação dos jovens para o mercado de trabalho e à inclusão social, para construir uma cidade menos violenta e mais humana
10-08-2020 | 16:50:46
Em agosto de 2017, Pelotas passou a fazer parte de um grupo de cidades comprometidas em promover uma transformação, a longo prazo, de uma realidade entranhada no comportamento social no decorrer dos anos - a banalização da violência. Inspirado no modelo implantado em uma das cidades mais corrompidas pela criminalidade instaurada pelo tráfico de drogas, no mundo, - Bogotá, na Colômbia-, o Pacto Pelotas pela Paz foi construído a partir de um conjunto de estratégias que, além de reduzir os índices de crimes como homicídios, assaltos, roubo a pedestre, apostam em uma mudança cultural dos moradores. Há três anos, o significado da palavra 'pacto"passou a ser real - um acordo entre Poder Público, inúmeras instituições e a comunidade para a concretizar um futuro de paz.
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Construído a partir de um diagnóstico feito pelo Instituto Cidade Segura, que avaliou a situação de violência em Pelotas, com referência em pesquisa de vitimização em 2017, e baseado em evidências científicas eficazes para reduzir a violência, o Pacto Pelotas pela Paz se alicerçou em eixos de atuação. Um deles é a Prevenção Social, que tem 22 programas, com o objetivo de aumentar a proteção sobre os grupos considerados mais vulneráveis para a violência, com ações junto às famílias, às escolas de qualificação profissional e, até mesmo, de reinclusão social de presos. Iniciativas que começam a ter resultados positivos ao se efetivarem nas comunidades, como avalia a prefeita Paula Mascarenhas, responsável pelo basta à violência ao adotar o Pacto Pelotas pela Paz como uma ação estratégica contra o crime.
"Nós reduzimos a criminalidade em Pelotas a índices extremamente significativos, que chamam a atenção do Estado e do país, e estamos organizando projetos de prevenção que vão construir, e já estão construindo, a partir de agora, um novo futuro para milhares de famílias, jovens, crianças, que certamente vão estar mais protegidos contra a violência. Tudo isso se deve a uma grande união, à dedicação de servidores públicos e também ao engajamento da sociedade, em seus vários segmentos que acreditaram nesse projeto, se uniram e mostraram que, no Município, nós podemos vencer a violência", avalia Paula.
A constatação da gestora municipal recebe apoio da diretora do Instituto Cidade Segura, Tâmara Biolo Soares, que acompanha a análise da realidade enfrentada por Pelotas há 3 anos. Ela frisa que todas as ações do eixo de prevenção têm focos diferentes e são importantes para o sucesso do Pacto.
"Cada um tem seu papel: o Mão de Obra Prisional e a APAC focam na prevenção terciária, muito negligenciada no Brasil. Os programas Conte Comigo e ACT são relativos à prevenção primária, para que as crianças sejam criadas sem o uso de violência. E, hoje, se sabe que essa prevenção é a mais barata e muito efetiva no longo prazo. Hoje, Pelotas é um caso exemplar de redução da violência, internacionalmente reconhecido, e é um orgulho para nós do Instituto Cidade Segura termos desenhado, construído e executado o Pacto Pelotas pela Paz junto com o Município", elogia Tâmara.
Alguns projetos da prevenção social tiveram uma pausa em 2020, desde quando surgiram os primeiros casos do coronavírus na cidade - boa parte deles precisa ser realizada de forma presencial. Outros se mantiveram e até redescobriram outra forma de ocorrer, utilizando-se da tecnologia para manter os vínculos entre os participantes. Entre eles, está o Justiça Restaurativa nas Escolas, executado através dos Círculos de Construção da Paz. A pandemia do coronavírus mudou o formato. Agora, os encontros são virtuais, mas o diálogo ainda é a essência do projeto. A partir do sucesso nos Foros, presídios e nas instituições de menores infratores - onde é utilizado na resolução dos processos judiciais -, foi levado para as salas de aula de Pelotas, com o papel de fazer da conversa a melhor tática contra a violência, mesmo contra aquela que ainda não aconteceu.
Há três anos, estudantes e professores de 42 escolas municipais de Pelotas escolhem temas, muitos ligados à realidade em suas casas e comunidades, orientados por facilitadores que conversam e escutam, se reconhecem na história do outro. Presencialmente, eles têm esse momento de prevenção a conflitos e estabelecimento de vínculos sentados em círculo.
"Foi comprovado cientificamente que, quando sentamos em círculo, temos a oportunidade de falar sabendo que os outros escutarão, somos encorajados a falar de nossos sentimentos de forma transparente. Ao percebermos aquele espaço como um ambiente seguro, adquirimos confiança e desenvolvemos a empatia. Percebemos, na história do outro, a nossa própria história - ambas se relacionam. Desta maneira, estabelecemos uma conexão com aquele grupo prevenindo possíveis conflitos e violência", explica a coordenadora do Projeto Justiça Restaurativa e Círculos de Construção da Paz, Jussara Tedesco dos Santos Cruz.
O projeto, que é considerado a base do eixo de prevenção na pirâmide do Pacto Pelotas pela Paz, já chegou a quase 10 mil pessoas, durante 577 Círculos, alguns realizados fora do ambiente escolar - em condomínios do programa Minha Casa Minha Vida, como forma de estreitar laços de boa convivência entre os moradores. A coordenadora da iniciativa calcula que, só em 2020, mesmo com a impossibilidade dos encontros nas escolas, pela suspensão das aulas como prevenção ao coronavírus, 2.831 estudantes e professores, integrantes das comunidades escolares, assistiram a videoconferências, os chamados Círculos Virtuais, e descobriram uma nova forma de se conectar, de não estar sozinhos, nunca.
"Nesta era de pandemia, os Círculos vieram para concretizar a certeza que precisamos do outro para viver, que a nossa força vem do outro, que nossos pensamentos precisam evoluir. Esta reclusão nos lembra de acordar para a vida, de sermos gratos pelo que possuímos e a não pensar no que nos falta, nos mostrando um caminho de transição, através da transformação interna de cada um", relata.
Quem guia a conversa, a troca de experiências, também é impactado. Hoje, cerca de 100 facilitadores, servidores capacitados para executar todas as etapas do Justiça Restaurativa nas Escolas, inclusive os encontros online, tornam real o trabalho de prevenção à violência. Dos 22 círculos que orientou na Escola Municipal Dr. Mário Meneghetti, onde trabalhar há 11 anos, a facilitadora Bianca Aires da Silva não sabe dizer qual foi o mais marcante, já que, a cada encontro, uma nova conexão é construída, além da possibilidade de transformação e autoconhecimento da sociedade onde pais, professores e estudantes estão inseridos.
"Saio dos Círculos energizada e grata pela oportunidade de escuta de diversas realidades. Os Círculos nos possibilitam a percepção de que não estamos sozinhos, além da sensação de amparo e valorização", garante Bianca.
Crianças a partir dos três anos já podem participar dos Círculos. Não conta na nota escolar, ninguém é avaliado. São pessoas que, a partir de perguntas, falam, ouvem, criam laços, constroem, juntas, um futuro de Paz.
" Eu tive que me educar primeiro, em cada reunião, em cada conversa nos encontros. Eu gritava muito com minha filha, queria bater nela. Aprendi que conversar educa a ti e ao filho. Em primeiro lugar vem o respeito entre nós", relata uma mãe.
Esse é o depoimento da mãe de uma menina de 3 anos e 9 meses, atendida em uma Escola Municipal de Ensino Infantil (Emei). É o resumo que ela faz de como era e como está agora a relação com a pequena, após aceitar participar das reuniões do projeto programa psico socioeducativo Criando Crianças em Ambientes Seguros (ACT). Mais uma vez, a conversa, dessa vez com a família, é a base - simples, mas transformadora -, de uma frente de prevenção social à violência integrante do Pacto Pelotas pela Paz.
Implantado nas Emeis em 2018, no ano passado o programa tornou Pelotas a primeira cidade do mundo a adotar o ACT como política pública - uma decisão do governo em aplicá-lo como instrumento de prevenção à criminalidade nas escolas municipais. Com a colaboração da Associação Americana de Psicologia (AAP), o Município levou a ação para Escolas de Educação Infantil e Fundamental (Emeis e Emefs) e também a Centros de Referência e Assistência Social (Cras), formando 210 famílias ligadas a crianças com idades de zero a 10 anos.
A sistemática parte da adesão de algum membro da família na participação em reuniões realizadas por facilitadores - hoje, um total de 14 pessoas -, que trabalham temas relacionados ao desenvolvimento infantil, como lidar com a raiva (tanto do adulto, quanto da criança), a disciplina positiva, a influência das mídias, os tipos de violência. Ao discutirem e entender esses assuntos, seguindo o método criado pela psicóloga brasileira Júlia Silva, membro da AAP, os participantes se tornam capazes de estimular bons exemplos, criando ambientes familiares mais seguros, livres de violência e, assim, colaborando para a formação de adolescentes, e até mesmo adultos, distanciados da criminalidade.
"Não é um curso, é uma troca de saberes. Trazemos ferramentas que podem ser utilizadas na prática com os filhos. Não existe um modelo - já que muitas pessoas só aplicam o que aprenderam com seus próprios pais. Mas, a gente mostra que existem outros caminhos", explica a facilitadora Jaqueline Manske.
Quem participa diz que as mudanças ocorrem no comportamento de todos. As crianças passam a ser ouvidas e conseguem se expressar melhor; os adultos também percebem o quanto é melhor evitar a violência, a partir do núcleo familiar. Até quem já criou os filhos admite que poderia ter sido diferente.
"Sempre falo que se tivesse participado de um programa como esse, há 40 anos, seria mais fácil para minha nora, minha filha e neta criarem os filhos delas agora. Hoje sei que devemos prestar mais atenção no comportamento das crianças. Elas falam através das atitudes", diz uma avó que convenceu o restante da família a participar do ACT.
Nem a pandemia paralisou a ação baseada na construção de relações mais harmônicas entre pais e filhos. A equipe do ACT mantém o contato por meio de ligações telefônicas e das redes sociais. As famílias recebem desde artigos, reportagens, vídeos, até atividades de possam ser desenvolvidas por todos os membros. Também foram realizadas campanhas de arrecadação de alimentos e agasalho, como forma de auxiliar quem foi atingido economicamente pelas ações de enfrentamento ao coronavírus.
O projeto Start oferece aos jovens das escolas municipais uma oportunidade de preparação e ingresso no mercado de trabalho, por meio de cursos nas escolas e no Espaço da Juventude, junto ao Centro de Referência de Assistência Social (Cras) São Gonçalo. Durante a formação, os estudantes são incentivados ao protagonismo juvenil, através da apreensão de conceitos do empreendedorismo social, que une a iniciativa de criação de novos serviços e negócios com a busca pela solução de problemas de uma comunidade.
O Start é vinculado ao Banco de Oportunidades, uma parceria da Prefeitura de Pelotas com empresários do Município, organizações sociais e instituições de ensino, que insere os jovens em oficinas de esporte e cultura, e os encaminha para oportunidades de emprego.
Durante o curso, os temas abordados são o empreendedorismo, liderança, comunicação, produção de currículos e preparação para entrevistas. Palestrantes parceiros, do Centro de Integração Empresa-Escola (CIE-E), e da Fundação Gaúcha de Trabalho e Ação Social (FGTAS)/Sine, complementam a formação dos alunos.
Na modalidade presencial, os participantes apresentam um trabalho final de conclusão, recebem certificado de participação e realizam formatura. Mais de 300 jovens concluíram o Start até o final de 2019, e cerca de 40 destes conseguiram um emprego após o término do curso.
Em 2020, com a pandemia do novo coronavírus, o projeto precisou se reinventar para respeitar as normas de distanciamento social. Com isso, foi criado o Start Online, em caráter experimental, de modo a dar continuidade ao trabalho e possibilitar uma atividade produtiva aos estudantes que estão em casa desde março, com a suspensão das aulas presenciais.
No dia 7 de agosto, a primeira turma do modo virtual do Start apresentou seus trabalhos de conclusão, com propostas de criação de startups fictícias que trariam soluções para problemas criados pela pandemia. A formatura, por conta do distanciamento, não poderá ocorrer, mas os cerca de 40 estudantes que realizaram o curso até o final receberão um certificado digital. As atividades foram desenvolvidas por meio de videoconferências, grupos de bate-papo e outras ferramentas virtuais gratuitas disponíveis. Os conteúdos em vídeo, textos em PDF e podcasts foram compartilhados com os alunos via internet.
De um lado, o diálogo como alicerce para relacionamentos equilibrados e a mudança de estratégias na educação infantil; de outro, o trabalho como redescoberta da dignidade. Com o ideal de ressocializar pessoas que cometeram crimes, o Mão de Obra Prisional se insere no Pacto Pelotas pela Paz após provar ser importante para o Poder Público e a sociedade. O coordenador do projeto, Leandro Thurow, lembra a primeira ação realizada, em 2015, quando os próprios detentos reformaram a sala de saúde do Presídio Regional de Pelotas. Logo em seguida, foi a vez dos presos entregarem 11 Unidades Básicas de Saúde (UBSs) em estado de novas à comunidade.
"Com o advento do Pacto, a consultoria do Cidade Segura foi convidada para realizar uma visita ao Presídio Regional de Pelotas, oportunidade na qual compartilhamos da história do MOP e suas experiências. Imediatamente, o projeto passou a integrar o eixo de Prevenção – prevenção terciária – do Pacto Pelotas pela Paz", recorda Thurow.
Até agora, outras 20 obras foram realizadas pelo MOP. Entre elas, a reforma do Pronto Socorro Municipal. A pandemia redobrou a importância do projeto e levou os presos para auxiliar na obra de reestruturação do Centro Covid, na reforma de uma ala da Santa Casa, de duas Unidades de Saúde e do setor de Veículos e Manutenção da Secretaria Municipal de Saúde (SMS).
Segundo o coordenador do MOP, cerca de 120 presos já atuaram no programa, todos sempre indicados pela direção da casa prisional, a partir do perfil e qualificação profissional de cada um. Os apenados do regime semiaberto usam tornozeleiras, podendo passar a noite em casa, usam transporte coletivo e têm carga horária como todo trabalhador de segunda a sexta-feira. As obras contam com servidores municipais encarregados dos trabalhos de campo, responsáveis pelo suprimento dos materiais e orientações dos trabalhos.
O MOP também abriu frente para a realização de outros dois projetos do eixo de prevenção social do Pacto Pelotas pela Paz: o Artecon P e a Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC). No primeiro, os detentos do regime fechado têm a oportunidade de se preparar para o retorno à sociedade, ao se tornarem empregados em uma fábrica de tubos de concreto que funciona dentro do Presídio. O material fabricado por eles é utilizado em obras de redução de esgotos a céu aberto. Na segunda ação, o MOP atuou na construção, em Pelotas, do segundo presídio alternativo ao modelo convencional, do Estado, capaz de evitar a reincidência no crime, com metodologia baseada no amor, perdão e confiança.
"A oportunidade tem ido além do trabalho, tem sido de (re)integração social, à medida que os apenados são inseridos nos espaços dos serviços públicos, convivendo com os profissionais do Município e os usuários desses espaços. Os prédios públicos, alvo do trabalho, passam a ter seu valor (re)significado como espaços coletivos, que precisam ser preservados para o bem de todos', relata Thurow, ao contar que cinco UBSs revitalizadas, antes alvos de pichação, não voltaram a sofrer com o vandalismo - um sinal de que a interação entre presos e comunidades tem resultado positivo.
Muitos presos também destinam parte do pagamento que recebem para a subsistência de suas famílias - o que, para os coordenadores do projeto, significa o compromisso com a retomada da vida longe do crime.
O programa Cada Jovem Conta também tem sido um dos destaques do Pacto, ao trabalhar o resgate a estudantes em processo de evasão escolar. Os comitês criados nas escolas, localizadas em zonas da cidade consideradas violentas, acompanham 200 casos de menores que enfrentam os mais diversos problemas, como por exemplo más condições de moradia. Segundo os coordenadores do programa, 87% dessas crianças e adolescentes tiveram melhora na conduta escolar e, o mais importante, não abandonaram a escola.
Também fazem parte do eixo de Prevenção Social os seguintes projetos:
- Conte Comigo - mais de 200 crianças envolvidas no compartilhamento de livros.
- Educação Empreendedora - com a capacitação, até agora, de 2.750 alunos para se tornarem empreendedores e não evadirem das escolas.
- Comissão Interna de Prevenção da Violência Escolar (Cipave) - ação que já mobilizou 60 escolas para identificar e planejar estratégias de prevenção à violência.
- Metodologia Socioemocional - ações de desenvolvimento de habilidades socioemocionais com alunos do 1º ao 5º anos de cinco escolas municipais.
- Construindo Saberes, já atingiu 420 alunos com dificuldades de aprendizagem; mulheres durante a gravidez e a chegada de um novo membro nas famílias.
- Construindo Saberes ,- já atingiu 420 alunos com dificuldades de aprendizagem.
- Plano Anual de Prevenção da Violência na Escola - atua em 60 escolas com medidas de prevenção ao bullying e abuso infantil.
- Erradicação do Sub-Registro Civil de Nascimento -, garantiu que apenas 10,4% dos bebês saíssem sem certidão de nascimento das maternidades.
- Redução da Vitimização Precoce - implementou fluxo único de atendimento de casos de maus-tratos, negligência e abuso sexual contra menores.
- Segunda Chance Jovem - proporcionou oficinas profissionalizantes para mais de 30 jovens.
- Banco de Oportunidades - captou 870 vagas em cursos, oficinas de esporte, cultura e oportunidades de emprego junto ao empresariado local.
- Espaço da Juventude - visa à autonomia e liderança de jovens das comunidades consideras vulneráveis.
- Bons Vizinhos - com quase 1.600 pessoas envolvidas em ações de soluções de conflitos em sete residenciais.
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