O recurso, inédito no país, será destinado à construção do Centro de Reintegração Social onde serão implementadas ações da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados
16-01-2021 | 14:20:45
"A APAC me ensinou que do amor ninguém foge. Não é só amar aos parentes, é amar todas as pessoas, respeitar todas as pessoas. A APAC restaurou a minha família". É assim que um recuperando de 39 anos , condenado a cumprir sentença de 14 anos por homicídio, resume a mudança no próprio comportamento ao passar a fazer parte do método aplicado pela Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC) em Pelotas. A iniciativa que tem como propósito a ressocialização humanizada de presos oficializou, nessa quarta-feira (13), a possibilidade transformar um número maior de vidas atingidas pela violência, como a do homem que diz ter aprendido a amar. A APAC do município receberá dos governos federal e estadual cerca de R$ 9 milhões para a construção do Centro de Reintegração Social que terá capacidade para 200 recuperandos.
Criada há 3 anos, a APAC de Pelotas, que integra o eixo de Prevenção do Pacto Pelotas pela Paz, é a única nas regiões Sul e Sudeste do país, a receber recursos inéditos do projeto piloto do Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN), sendo um total de R$ 7,56 milhões. Além da verba federal, a entidade também irá receber R$ 1,51 milhão da Secretaria Estadual de Administração Penitenciária. Além da construção do prédio do Centro de Reintegração Social, os recursos também serão utilizados para o aparelhamento da unidade prisional. A prefeita Paula Mascarenhas comemorou a notícia, destacando que o dinheiro garantirá a construção de um Centro de Ressocialização com infraestrutura adequada para oferecer trabalho diversificado aos recuperandos.
"Esse recurso nos permitirá tornar a nossa APAC, a segunda do Estado, o modelo que nós sonhamos. Conseguiremos praticar a ressocialização efetiva. Vai ser um exemplo para o Estado e o país a nossa APAC, não tenho dúvida. Mostraremos o quanto se pode transformar vidas, o quanto se pode oferecer uma nova chance à pessoas que vem do mundo da violência e o quanto elas podem se reintegrar na sociedade de forma produtiva e colaborativa", frisou Paula.
A negociação com o FUNPEN foi iniciada por uma comitiva pelotense, liderada pelo vice-prefeito Idemar Barz, que esteve em Brasília em 2018, para receber o Selo Resgata - prêmio concecido a municípios com destaque na utilização da mão de obra prisional -, e se concretizou com o envio, em dezembro do ano passado, dos documentos exigidos pelo Departamento Penitenciário Nacional para habilitar a APAC de Pelotas ao financiamento do Projeto Ressocializa. Segundo o presidente da Associação, Leandro Thurow, uma portaria do Ministério da Justiça e Segurança Pública, publicada em novembro, determinou os procedimentos, critérios e prioridades para concessão do recurso.
"A conquista de Pelotas é decorrente, além do esforço de um grupo ligado a Secretaria Municipal de Saúde (SMS), do reconhecimento do projeto Mão de Obra Prisional no SUS (MOPSUS), recentemente aprovado para se tornar política pública nacional pelo Ministério da Saúde. Também é resultado do trabalho recente, sério e ousado, da Associação de Proteção de Assistência aos Condenados de Pelotas", destaca Thurow.
O Centro de Reintegração Social será construído no terreno onde já funciona, provisoriamente, a APAC. A área, cedida pelo governo do Estado, localizada próxima ao Centro de Eventos da Fenadoce, abrigará o prédio de 4.747,90m². A unidade contará com espaços individualizados para três regimes: fechado - 104 vagas, semiaberto - 66 vagas, e semiaberto extra muros - 30 vagas.
Para os recuperandos que cumprem pena no fechado, a estrutura oferecerá 13 celas, auditório, refeitório, lavanderia, barbearia, capela, livraria, sala de professores, três salas de aula, consultórios médico e odontológico, além de suítes para visitas íntimas. Sendo que os demais regimes terão espaços semelhantes. O setor administrativo será composto por sete salas para revista e atendimentos técnicos, jurídico, financeiro, diretoria e reuniões.
"A proposta do projeto piloto que selecionou a APAC Pelotas é que a nossa APAC seja referência para os países do sul da América Latina e também para o sul do Brasil, fazendo com que Pelotas assuma papel de protagonista na ressocialização prisional", salienta o presidente.
O método APAC de ressocialização já comprovou sua eficácia em apresentar médias nacionais de 15 a 20% de reincidência no crime contra 70% do sistema carcerário convencional. Os próprios recuperandos - assim são chamados os presos da APAC -, testemunham sobre a diferença entre cumprir pena na prisão e em um local administrado pelos próprios presos, com base na humanização, família, estudo, profissionalização, trabalho, geração de renda e valores cristãos.
"No presídio tu estás trancado, a vida não cresce. Aqui a minha família está mais perto de mim e eu até já começo a pensar em estudar. Quero concorrer a uma vaga do curso superior de Tecnologia e Empreendedorismo e quem sabe no futuro fazer uma faculdade de Educação Física", revela um recuperando de 29 anos que está concluindo a condenação.
Até maio deste ano, a APAC Pelotas terá 20 recuperandos, escolhidos a partir do histórico de bom comportamento apresentado no cumprimento de pena no Presídio Regional de Pelotas (PRP). Eles têm uma rotina rígida, onde não existe ociosidade - todos têm tarefas do amanhecer até o anoitecer -, são responsáveis pela manutenção do local e, até mesmo, preparo dos alimentos. Além de "reaprenderem" a conviver em grupo, todos concordam em um ponto: a APAC trouxe a família e a dignidade de volta.